Dia desses em um curso uma aluna fez algumas perguntas sobre I Ching. Expliquei como se fazia a análise do hexagrama e ela ficou impressionada, pois não havia visto isso, ao menos com esse grau de destaque.
Esse evento me motivou a escrever esse artigo de modo a explicar ao menos superficialmente como eu entendo uma análise do hexagrama que tiramos, seja em resposta a uma pergunta ou outro fator. Como eu disse, é meu entendimento e meu modo de proceder. Cada pesquisador ou estudioso tem uma técnica preferida e mais à frente ficará claro porque fiz essa opção. Ela facilita e muito a interpretação do hexagrama.
Depois de encontrado o hexagrama, por qualquer modo que seja, podemos fazer várias análises e desenvolvimentos a partir dele, sem abrir nenhum livro (ainda). Vamos identificar os trigramas componentes, externo/interno, para termos uma idéia geral. Em seguida analisaremos as linhas, se possuem maioria inteira ou quebrada, se corretas ou incorretas, e qual a posição delas, sua sucessão e relação interna. Verificamos também a existência de linhas móveis e sua posição (que revela o fator temporal da consulta), bem como a situação da linha governante. Retiraremos também o hexagrama nuclear, que revela o cerne da situação. Se existirem linhas móveis vamos fazer o desdobramento no novo hexagrama que revelará uma situação próxima futura, o desenvolvimento final da situação retratada no hexagrama original. Faremos as mesmas análises para esse novo hexagrama.
Com isso veremos de maneira muito clara a situação apresentada pelo I Ching. Note que até aqui não abrimos livro algum. Isso tudo pode ser feito de cabeça!
Concluídos esses passos, então você pode abrir o livro do I Ching na versão de sua preferência, e analisar o nome, imagem, julgamento e os textos das linhas para uma melhor compreensão da situação mostrada.
Eu considero esse o melhor caminho por várias razões. A principal delas é que existem muitas versões do I Ching, de diferentes autores, de diferentes escolas, em línguas diversas. Isso atrapalha muito a clareza do texto. Mesmo os chineses hoje lêem o I Ching “traduzido”, pois é necessário passar do chinês antigo para o chinês moderno e corrigir ambigüidades, interpretar o significado dos ideogramas na época e acertar a pontuação, que não existe nos textos antigos. Depois os textos chineses muitas vezes passam por várias línguas antes de chegarem ao português, com exceção da versão do Mestre Wu Jhy Cherng que foi traduzida diretamente do chinês antigo para o português.
O texto original também é bastante sintético, o que torna suas sentenças curtas e, muitas vezes, enigmáticas. O I Ching em sua versão original é um livro pequeno, com cerca de 4.000 ideogramas, tamanho próximo do Tao Te Ching.
Das duas versões internacionais mais conhecidas, Richard Wilhelm era um missionário alemão enquanto James Legge era um acadêmico inglês, o que torna suas visões da China muito diferentes. Mestre Wu fez a tradução direta segundo sua escola taoista, portanto é uma versão particular que usa inclusive outra ordem de hexagramas. Não quero com isso tecer qualquer tipo de crítica a esses trabalhos, muito pelo contrário. Apenas desejo explicar porque as dezenas de versões existentes do I Ching são tão diferentes entre si. Qual escolher dentre estas já é uma tarefa enorme, que dirá interpretá-las.
Por isso eu não fiz outra tradução do texto em meu livro “I Ching – Manual do Usuário”, pois acho que existem pessoas mais abalizadas que eu neste setor. Desejei com a obra divulgar melhor essas análises e permitir um conhecimento maior da estrutura do livro e principalmente de suas aplicações práticas em áreas tão diversas quanto artes marciais, medicina e alquimia.
A esse problema temos que somar o sem-número de comentários incluídos nas obras, muitas vezes sem a devida separação. Muito do que vemos na tradução de Wilhelm, por exemplo, são comentários de Confúcio e não o texto original. Em edições chinesas os comentários, mesmo de Confúcio, geralmente são bem separados, em um apêndice no final do livro. Quando não se restringem apenas ao texto original, ignorando os comentários (tenho uma versão chinesa assim).
Então é bastante complicado pegar um hexagrama e se jogar direto no livro tentando fazer o texto coincidir com a pergunta. No início do início o I Ching não tinha textos, eram apenas os hexagramas. Os textos só foram escritos em 1021 a.C. devido ao fato das pessoas já começarem a esquecer seu significado pela grande idade da obra. E, de fato, os hexagramas e sua estrutura são a base e o fundamento do livro, grafados em uma linguagem binária universal. Então temos que tirar proveito dessa linguagem universal e tentar encontrar o maior número possível de informações antes de tentar decifrar o texto do livro. Com isso o seu trabalho será muito mais tranquilo e o prazer em obter acesso a essa sabedoria será muito maior.
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Gilberto Antônio Silva é Parapsicólogo e Jornalista. Estuda filosofias e culturas orientais desde 1977 e é autor de 14 livros. Como Taoista, atua amplamente na pesquisa e divulgação desta fantástica filosofia chinesa. Sites: www.taoismo.org e www.laoshan.com.br.